por Fabiana Andrade, Psicóloga Clínica
André sempre foi extremamente exigente consigo mesmo e com os outros. Filho de pai militar e mãe professora, habituou-se a que os bons resultados fossem sinónimos de afeto, enquanto qualquer coisa diferente era sinónimo de deceção, castigos, sermões e por vezes até mesmo umas palmadas. Assim, nunca percebeu os seus sinais de desgaste e exigia o máximo independentemente dos próprios recursos. Começou a desrespeitar-se sistematicamente, levando o corpo, a mente e as emoções a um estado de total exaustão.
O facto de estar a ser repreendido, quer no trabalho, quer pela noiva, aumentava ainda mais a sensação de culpa e de estar a dececionar todos à sua volta.
A utilização do 'mindfulness' foi fundamental para que o André passasse a perceber como funcionava. Este método consiste em praticar uma atitude de atenção plena (por exemplo através da meditação e da atenção à respiração), uma estratégia treinada para que a mente se mantenha no 'aqui e agora', com uma capacidade de observação não avaliativa. É uma abordagem científica, ainda que beba a sua origem às tradições de meditação budista.
Após 12 sessões baseadas em exercícios de 'mindfulness' e em trabalhos de casa, o André passou a identificar os seus recursos a cada dia (se estava cansado, se estava doente, se estava feliz ou triste, se tinha dormido bem ou não) e passou a adaptar as suas expectativas tendo em conta os recursos existentes, em vez de um ideal inalcançável.
'Mindfulness': Mais clareza sobre a mente e o corpo
Aprendeu a identificar a “voz exigente e injusta” que surgia constantemente na sua mente, e passou a conseguir interrompê-la, permitindo que uma forma de estar mais saudável e justa ganhasse espaço. Conseguiu, a cada momento, encontrar estratégias de relaxamento e de gestão da ansiedade, deixando de estar refém das manifestações físicas que as suas tensões provocavam.
No trabalho, tudo e todos eram altamente exigentes. Horas extra eram o habitual, prazos irreais, pressão por todo o lado. André começou a aprender a respirar antes de se “deixar levar na onda”. Passou a sentir-se mais calmo, mais claro, mais feliz consigo mesmo, e por isso mais produtivo. Notava que trabalhava melhor, cumpria os objetivos, sem estar muito ansioso ou stressado. Dizia muitas vezes que tudo passou a estar mais fácil.
O 'mindfulness' aumenta a energia, a clareza, a capacidade de memória e de concentração. Além disso, aumentando a clareza sobre o que se passa momento a momento dentro de nós poderemos respeitar melhor as nossas necessidades, melhorando substancialmente o nosso bem-estar.
Antes de praticar 'mindfulness', o André relatava que, quando estava a trabalhar, por vezes nem se lembrava de comer ou de ir à casa de banho.
Estes “esquecimentos” ou desrespeitos têm consequências graves, como a quebra de energia. Ao quebrar a sua energia e ao estar menos produtivo, deixava entrar pensamentos críticos sobre si mesmo, em vez de observar o que estava a acontecer e a regular a situação. Por sua vez, estes pensamentos críticos ainda minavam mais o seu bem-estar, contribuindo para que o ciclo negativo fosse interminável.
O 'mindfulness' permite que tenhamos clareza sobre o que se passa dentro e fora de nós. Nos pensamentos, no corpo, na emoção e na nossa interação com o que nos rodeia. Esta observação é feita sem julgamento, e a clareza aumenta o poder que temos sobre os nossos processos e sobre a nossa vida. Tudo fatores que contribuem para um maior bem-estar, maior produtividade e rendimento, maior capacidade de decisão, entre outros benefícios.
A história do André ilustra bem como uma pessoa apanhada nas redes das exigências do dia a dia se pode perder, arriscando a ficar doente, perder pessoas importantes, perder o emprego, sem nunca se ter dado conta do que estava realmente a acontecer.
_____________________________________________