O júri da academia destacou que Tomas Transtromer, nascido a 15 de abril de 1931 em Estocolmo, é “um dos poetas vivos mais traduzidos em todo o mundo (em 30 línguas)”, cuja obra incide sobre “a morte, a História, a memória e a natureza”.
O escritor sucede, neste galardão, a Mario Vargas Llosa, vencedor da edição de 2010. O prémio Nobel da Literatura tem o valor monetário de dez milhões de coroas suecas, cerca de 1,1 milhões de euros.
Tranströmer, de 80 anos, começou a publicar poesia aos 23 anos e o seu primeiro livro intitulava-se “17 dikter” (“17 Poemas”).
Em 1990, o poeta foi vítima de um derrame cerebral que lhe afectou a capacidade de falar. Conseguiu recuperar mas anos mais tarde sofre outra série de derrames.
Perdeu, então, a capacidade de escrever pela própria mão sendo a sua mulher que vai apontando os seus poemas.
Em Portugal, Tomas Tranströmer está pouco traduzido, estando apenas representado na coletânea “21 poetas suecos”, editada pela Vega, em 1981. Contudo, o poeta conhecia bem o nosso país, tendo um poema intitulado “Funchal” (ver abaixo) e outro “Lisboa”, traduzido e publicado na coletânea da Vega.
Em “Lisboa” (tradução de Vasco Graça Moura), o poeta sueco destaca elementos típicos das zonas históricas da capital portuguesa:
“No bairro de Alfama os eléctricos amarelos cantavam nas calçadas íngremes/Havia lá duas cadeias. Uma era para ladrões/Acenavam através das grades/Gritavam que lhes tirassem o retrato.
'Mas aqui', disse o condutor e riu à socapa como se cortado ao meio/'aqui estão políticos'. Vi a fachada, a fachada, a fachada e lá no cimo um homem à janela/tinha um óculo e olhava para o mar
Roupa branca no azul. Os muros quentes/As moscas liam cartas microscópicas/Seis anos mais tarde perguntei a uma senhora de Lisboa/'será verdade ou só um sonho meu?'”
[poema de Tomas Tranströmer traduzido pelo poeta e ensaísta Luís Costa em 2007 e publicado na revista literária Agulha]
O restaurante do peixe na praia, uma simples barraca, construída por náufragos.
Muitos, chegados à porta, voltam para trás, mas não assim as rajadas de vento do mar. Uma sombra encontra-se num cubículo fumarento e assa dois peixes, segundo uma antiga receita da Atlântida, pequenas explosões de alho.
O óleo flui sobre as rodelas do tomate. Cada dentada diz que o oceano nos quer bem, um zunido das profundezas.
Ela e eu: olhamos um para o outro. Assim como se trepássemos as agrestes colinas floridas, sem qualquer cansaço. Encontramo-nos do lado dos animais, bem-vindos, não envelhecemos. Mas já suportámos tantas coisas juntos, lembramo-nos disso, horas em que também de pouco ou nada servíamos ( por exemplo, quando esperávamos na bicha para doar o sangue saudável – ele tinha prescrito uma transfusão). Acontecimentos, que nos podiam ter separado, se não nos tivéssemos unido, e acontecimentos que, lado a lado, esquecemos – mas eles não nos esqueceram!
Eles tornaram-se pedras, pedras claras e escuras, pedras de um mosaico desordenado.
E agora aconteceu: os cacos voam todos na mesma direcção, o mosaico nasce.
Ele espera por nós. Do cimo da parede, ele ilumina o quarto de hotel, um design, violento e doce, talvez um rosto, não nos é possível compreender tudo, mesmo quando tiramos as roupas.
Ao entardecer, saímos. A poderosa pata, azul escura, da meia ilha jaz,
expelida sobre o mar. Embrenhamo-nos na multidão, somos empurrados
amigavelmente, suaves controlos, todos falam, fervorosos, na língua
estranha. “um homem não é uma ilha”. Por meio deles fortalecemo-nos, mas também por meio de nós mesmos. Por meio daquilo que existe em nós e que os outros não conseguem ver. Aquela coisa que só se consegue encontrar a ela própria. O paradoxo interior, a flor da garagem, a válvula contra a boa escuridão.
Uma bebida que borbulha nos copos vazios. Um altifalante que propaga o silêncio. Um atalho que, por detrás de cada passo, cresce e cresce. Um livro que só no escuro se consegue ler.