A vida de Florbela Espanca foi plena e trágica, inspirada e sofrida: digna de um verdadeiro filme. Vicente Alves do Ó apercebeu-se da sua complexidade e transportou a história da poetisa para o ecrã, numa obra homónima que estreia esta quinta-feira.
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A vida de Florbela Espanca foi plena e trágica, inspirada e sofrida: digna de um verdadeiro filme. Vicente Alves do Ó apercebeu-se da sua complexidade e transportou a história da poetisa para o ecrã, numa obra homónima que estreia esta quinta-feira, Dia da Mulher, nos cinemas. Ao Boas Notícias, o realizador fala sobre os desafios de retratar “uma mulher à frente do seu tempo”. ANA AZEVEDO
Florbela faz parte daquele grupo de “pessoas incríveis e que merecem ser recordadas, ressuscitadas como exemplos de vida, talento e inspiração”. Um desafio, portanto. Mas porque acredita que “a vida só vale a pena quando nos colocamos em causa”, Vicente Alves do Ó não hesitou em agarrar a oportunidade de transformar a escritora em protagonista da sua nova longa-metragem.
Com uma longa experiência como guionista e com algumas, mais recentes, incursões pelo mundo da realização, o cineasta, de 40 anos, apostou os seus dois talentos no filme sobre a poetisa portuguesa – uma adaptação que nunca antes tinha sido experimentada.
Escrever sobre Florbela traz desafios porque, explica, “as pessoas associam-na ao estigma da tristeza e da depressão”. Na sua investigação, Vicente Alves do Ó percebeu que esta personalidade acarretava “mais do que isso”: “era um mundo de contradições, exaltações, episódios, amores e desamores”.
“A poesia vem da vida”
A vida de Florbela foi uma poesia que se estendeu para lá do papel e da caneta. Esteve casada três vezes, além de poetisa, foi jornalista e professora e foi também uma das primeiras mulheres a frequentar a faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Foram estas vivências que Vicente Alves do Ó quis retratar. “A poesia vem da vida, não vem do ar”, argumenta, sublinhando que Florbela “sabia que não podia negar-se a fazer e ser aquilo que sentia ser o caminho dela” e que essa “coragem, essa determinação feminina, num Portugal atrasado e machista, é de louvar”.
Florbela foi dona de personalidade frágil e, ao mesmo tempo, vincada, cuja obra marcou a Literatura Portuguesa do séc. XX. Nascida em finais do século anterior, a poetisa terá posto fim à própria vida com apenas 36 anos, numa morte, dizem, causada por “uma tristeza sem fim”, depois de ter vivido de uma forma considerada invulgar e ousada para a época.
O realizador e argumentista português acrescenta que a sua vontade não foi a de fazer “um filme sobre poemas, mas um filme poético”, e que também não quis pegar no lado polémico das relações pessoais da personalidade histórica nem contar uma “biografia clássica”. Em vez disso, o realizador empenhou-se em “libertar Florbela de todos os clichés” e revelá-la “como mulher, irmã, amante e filha”.
“Mulheres portuguesas merecem um lugar de destaque”
Alves do Ó admite que a associação ao Dia Internacional da Mulher foi “uma coincidência feliz – na realidade o dia 8 foi escolhido porque Florbela nasceu e morreu a 8 de Dezembro -, mas que esta pode ser uma boa ocasião para reforçar que “as mulheres portuguesas merecem um lugar de destaque na sociedade e História de Portugal, e devem ser lembradas e celebradas pelos seus feitos e personalidades”.
Outra mulher em destaque no filme é, naturalmente, Dalila Carmo, a atriz que tem a seu cargo o papel da protagonista, ao lado de um elenco bem conhecido dos portugueses – do qual também fazem parte nomes como Ivo Canelas, Albano Jerónimo ou Rita Loureiro.
A intérprete foi escolhida por ser “uma grande grande atriz, uma mulher muito inteligente, sensível, atenta e de uma dádiva inquestionável”, que se aproximava muito “da fragilidade” que o diretor queria colocar na sua Florbela.
Quando “pensar que sei tudo sobre cinema é porque perdi o norte”
Vicente Alves do Ó também se revê na poetisa e afirma-se, como ela, um “insatisfeito”. “Estou sempre à procura dos meus defeitos, das minhas falhas, para melhorar como realizador, para me perceber melhor e aos que assistem aos meus filmes”, confessa, justificando as diferenças que o público poderá identificar entre a realização de “Florbela” e a da sua longa-metragem anterior (a primeira do seu percurso como realizador), “Quinze Pontos de Alma”.
“No dia em que pensar 'faço filmes perfeitos e sei tudo sobre cinema' é porque perdi o norte e no fundo, não sei nada sobre a vida”, defende.
O avanço para uma terceira longa-metragem já está no pensamento do realizador mas os próximos três meses estão reservados a “andar pelo país a mostrar a Florbela” e a terminar um romance que está a escrever.
Entretanto várias cidades do país já receberam a antestreia do filme, distribuído pela Ukbar filmes, nomeadamente duas das cidades onde o filme foi rodado: Vila Viçosa (onde nasceu Florbela Espanca), e Lisboa (onde a escritora viveu durante algum tempo).
Salvaguardando que “ninguém fala mal do seu próprio filho”, Vicente Alves do Ó assegura que recordará para toda a vida as reações nas antestreias que “não podiam ter sido mais positivas” e “emocionais”.
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