Cultura

“Há lugar para o humor mesmo nas tragédias”

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Sabia que os caracóis têm dentes? Que Thomas Edison tinha medo do escuro? Que a voz de Tina Turner é ideal para afastar aves? E que Cleópatra não era egípcia mas grega? “O Novo Livro das (In)Utilidades” (Guerra & Paz) contém mais de 4.000 factos tão inúteis, viciantes e divertidos como este.

por Patrícia Maia

Em entrevista ao Boas Notícias, o jornalista António Costa Santos, autor da original compilação, garante a veracidade dos factos mas alerta o leitor para não tentar comprovar alguns deles… Especialista em escrever livros divertidos sobre assuntos sérios, António Costa Santos defende que “há lugar para o humor, mesmo nas tragédias”, como as “troicas” que andam a visitar Portugal.

Foi divertido escrever O “Novo Livro das (In)Utilidades”? 
Divertidíssimo. Aliás, só assim é que eu aguentava uma pesquisa tão aturada… Sou um bocado preguiçoso. Agora, só espero que seja tão divertido de ler como foi de escrever, porque nesse caso vou vender mais milhões de exemplares do que o “Código de Da Vinci”. Dava-me jeito ficar rico.

Como andou à procura destas “pequenas estórias”? 
Quando ainda não havia Internet (eu sou antiquíssimo), guardava recortezinhos de jornais e sublinhava livros, porque sempre tive curiosidade por… tudo, de um modo geral. Claro que, quando resolvi compilar (adoro este verbo) os factos que publiquei no livro, não encontrei nem recortes nem sublinhados. Tive de ir à Net e a alguns livros de referência, como A Bíblia e o Almanaque Grandella de 1936, entre outros.

Garante a veracidade de todos os factos?
Garanto, mas não aconselho o leitor a comprovar alguns deles, como por exemplo o facto de um pinguim não aguentar mais de 28 minutos debaixo de água, sem se afogar. É feio andar a afogar pinguins, mesmo que seja a bem da ciência.
 
As inutilidades que recolheu para este livro (agora aumentado) já lhe foram úteis em alguma ocasião?
Algumas delas, sim, e outras, espero que ainda venham a ser. Por exemplo, pode ser-me útil saber que os crocodilos correm muito, mas quase sempre a direito. Se for perseguido um dia por um bicho desses, ponho-me aos ziguezagues e safo-me. É um livro que pode salvar vidas, portanto.

Acha que os jornalistas têm propensão para a recolha de inutilidades?Propensão, tendência, não é tanto os jornalistas, é mais os simpatizantes de jornalismo. Mas, ainda assim, nessa profissão temos sempre oportunidade para recolher montes de inutilidades, pois conversamos por dever com gente inútil. Que, como diz o meu avô, é o que mais há para aí.
 
O que considera informação útil?
Isso tem duas respostas. A primeira, de cortesia: Informação útil é a que o portal Boas Notícias publica. A segunda, filosófica: eu acho que toda a informação é útil. E não é só porque sou viciado. É porque uma pessoa informada vale por dez desinformadas. Nunca se perde nada em receber uma informação; mas pode perder-se muito, quando nos bloqueiam o acesso a uma.
 
Destes últimos livros que editou – “Proibido!”, “10 razões para Amar e Odiar Portugal” e “O novo livro das Inutilidades” – qual foi o mais desafiante? 
Declaradamente o “Proibido. Obrigou-me a investigar uma época caricata, feia, escura, cinzenta, freak, a do tempo que antecedeu o 25 de Abril. Até do ponto de vista pessoal, doeu. Fui adolescente em 1972, 1973 e tive de recordar-me de factos muito tristes, como, por exemplo, o de ter de olhar para todos os lados antes de dar um beijo na minha namorada, porque se algum polícia visse estava feito.
 
Que feedback tem tido deste seu livro?
O feedback, se bem que pouco porque o livro saiu há duas semanas, tem sido muito bom. Quem já lhe pegou (não digo quem já o leu, porque isto é para ir lendo), gostou – e não falo só da minha mãe, que essa gosta de tudo o que eu escreva, nem que seja um bilhete a dizer “é preciso comprar pão”. E toda a gente diz que é um livro muito bonito. A “Guerra e Paz” faz livros bonitos.
 
Alguma vez pensou escrever um livro num tom mais sério?
Já pensei, mas desisti. O problema é o seguinte: O “Proibido” é um livro “sério”. Estou a lançar nestes dias o “Diário de um Gajo Divorciado em Tempos de Crise”, que também é sério, até um bocadinho trágico, porque conta a história de um homem que, entre outros desgostos e gostos decorrentes do fim de um casamento, fica “órfão de filhos” e sofre bastante com isso… Mas tom sério, não consigo. Bem me esforço, mas acho que há lugar para o humor, mesmo nas tragédias, e que só não nos devemos rir da dor que os outros sentem. Além de que os amantes dos tons sérios têm sempre muito por onde escolher, Margarida Rebelo Pinto ou Dostoievsky, por exemplo. Eu faço voluntariado junto dos pobrezinhos que se querem rir de vez em quando e têm pouco com quê.
 
Cita muitas vezes o título de um livro de Paul Watzlawick, “The Situation is Hopeless but not Serious”. Acha que esta frase descreve bem a nossa atualidade?
Parece-me que sim. A situação portuguesa (e europeia) é desesperada. Mas não é grave. Gosto de frases paradoxais e gosto de atitudes inteligentes, que relativizem as coisas. A Europa (e Portugal, já agora) está de rastos; desemprego, desumanidade nas relações de trabalho, ditadura dos mercados e especuladores, capitalismo selvagem, esmagamento do indivíduo ao mesmo tempo que se apregoa e fomenta o individualismo, recuos civilizacionais à média de um por semana, uma desgraça pegada. Mas em 1933-45 foi mais grave. O atual ciclo negativo (a extrema-direita a subir nos votos dos países nórdicos é de me deixar de boca aberta) é isso mesmo: um ciclo. Não é um fado. Deve ser combatido e há-de passar. Como em Portugal: isto está mau, está péssimo, uma vida de troicas e badroicas, só se safam os bancos e os super-afortunados. Mas o Estado Novo ainda foi pior e acabou. Não há povo que aguente eternamente uma situação desesperada. Atrás dos tempos vêm tempos e outros tempos hão-de vir.

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