Durante estes dois dias, mais de 650 pediatras, neonatólogos, parteiros e responsáveis das UCIN (Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais) de todo o mundo ficaram a conhecer novas evidências científicas que demonstram o grande impacto para a sociedade do aleitamento materno, considerado “uma intervenção pública mundial de primeira ordem tão importante para a sociedade como têm demonstrado ser as vacinas”, nas palavras de Tricia Johnson, professora e economista da Universidade Rush de Chicago.
As apresentações feitas no simpósio estiveram orientadas para defender a importância de implantar programas de informação, consciencialização e divulgação sobre as características e o papel do leite materno para os bebés, as mães e a sociedade com um todo. A defesa da alimentação com leite materno é considerada pelos especialistas como uma inversão a curto prazo que oferece benefícios económicos à sociedade, exponencialmente superiores a longo prazo. Concretamente, estima-se que um aleitamento exclusivo durante os primeiros seis meses de vida suporia uma poupança de centenas a milhares de milhões de poupanças em custos de saúde diretos mundialmente a cada ano. Assim como um decréscimo da taxa de mortalidade, sendo possível salvar 800.000 vidas anualmente ao nível global. No hospital, o ROI custo-benefício estabelecido para o leite materno é de pelo menos 1:31.
Juntamente com a redução dos custos de saúde, o aleitamento materno também aumenta a produtividade dos trabalhadores e o Produto Interno Bruto (PIB), ao reduzir as ausências das mães e dos pais dos seus postos de trabalho. Além disso, os especialistas concordam na relação direta entre a saúde dos bebés e o consumo de leite materno prolongado no tempo, além dos seis meses de idade que recomenda a Organização Mundial de Saúde (OMS). Exemplo disso mesmo é o trabalho desenvolvido pelo vice-presidente da Sociedade Francesa para as Origens Evolutivas da Saúde e da Doença, o professor Laurent Storme, que define os primeiros mil dias de vida do recém-nascido como “a janela principal de oportunidade para a prevenção de doenças” . O seu esforço converteu o aleitamento numa prioridade fundamental dentro do programa nacional francês. Apesar das recomendações, os dados refletem que, dos 130 milhões de bebés que nascem no mundo anualmente, apenas cerca de 40% dos recém-nascidos são alimentados de forma exclusiva com leite materno.
Procurando soluções para melhorar a experiência de aleitamento
A capacidade do leite materno para prevenir doenças e reforçar o sistema imunológico dos bebés abre a porta para novos estudos sobre como melhorar e prolongar o seu consumo. Um dos problemas tratados durante o encontro de especialistas em Paris foi como a anquiloglossia ou freio lingual (língua presa) nos recém-nascidos dificulta o aleitamento, tanto para a mãe como para o bebé, já que entorpece a sucção e provoca dor na mama. À procura por uma solução para evitar o abandono do aleitamento, a professora Donna Geddes, da Universidade de Austrália Ocidental, expôs a sua análise dos tratamentos atuais para os recém-nascidos com anquiloglossia, com base em frenotomias (corte do freio lingual) nos recém-nascidos . As suas novas e precisas medições clarificam a complexa inter-relação entre as fisiologias da mãe e o recém-nascido e proporcionam uma base sólida para o desenvolvimento de novos tratamentos que evitem praticar uma operação cirúrgica aos bebés.
No caso das crianças prematuras, o papel do leite materno é ainda mais relevante dada a sua exposição a um maior número de doenças e problemas de desenvolvimento, assim como a sua maior necessidade de cuidados de saúde. Especialistas como Paula Meier, diretora dos Serviços de Aleitamento na Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN) do Centro Médico Universitário Rush, defendem a importância de garantir a dose mais elevada possível de leite materno para os bebés prematuros de modo a melhorar a sua cura e desenvolvimento, por meio do apoio e aconselhamento às mães. Uma ferramenta que, por sua vez, reduz os custos médicos que se teriam de investir nestas crianças no futuro.
As mães também beneficiam da prevenção de doenças
Proteger a saúde das mães é igualmente um fator social chave. Os últimos estudos demonstraram que as propriedades do leite materno afetam as mães, por exemplo, reduzindo o risco de virem a ter cancro da mama. O objetivo final dos investigadores é transformar as descobertas científicas em iniciativas de saúde avançadas em prol das mulheres que desejem amamentar.
No XIII Simpósio de Aleitamento Materno organizado pela Medela o principal tema tratado sob esta perspetiva foi as novas descobertas em torno das diferenças funcionais entre as células mamárias ativadas (produtoras de leite) e as células mamárias em repouso. Através de novos métodos, o grupo de investigação da Dra. Alecia-Jane Twigger, do Instituto de Investigação de Células Estaminais no Helmholtz Center, Munique, criou mini seios autónomos com capacidade de aleitamento em laboratório, procurando assim compreender e tratar o crescimento anómalo das glândulas mamárias, que podem resultar numa baixa produção de leite ou ao aparecimento de tumores.
Relação inversa: padrões sociais que afetam o aleitamento
Por outro lado, tanto a atitude como o ambiente envolvente das mães e os seus hábitos afetam o aleitamento materno, podendo ocasionar o abandono ou consequências negativas nos recém-nascidos. É este o caso que demonstra a investigação apresentada no simpósio por o Prof Thomas Hale, Fundador e Diretor Executivo do Centro Nacional de Risco em Bebés (National Infant Risk Centre) nos EUA, , sobre os riscos do consumo de marijuana por parte de uma mãe lactante. Face à tendência crescente no consumo de marijuana, encontraram-se novas e exaustivas evidências sobre a presença de substâncias químicas no leite das mães que consomem esta droga. Os estudos do professor Hale refletem o conteúdo de THC no leite materno para valorizar os possíveis danos que podem sofrer os lactantes, entre eles, problemas cerebrais, motores e de comportamento a curto e a longo prazo.
Por outro lado, outros indicadores sociais como a idade ou o nível educativo podem influir na manutenção do aleitamento durante um maior período de tempo. A investigação levada a cabo pela professora Meghan Azad da Universidade de Manitoba (Canadá) sobre a incidência de respiração ofegante em recém-nascidos desvenda, entre outras coisas, que as mães com mais de 35 anos são mais constantes com o aleitamento e o mantêm durante mais meses do que as mães mais jovens, a quem custa mais cumprir com os seis meses recomendados .