Cultura

Bons Sons: A festa na aldeia veio para ficar

Na sua 5.ª edição, de 14 a 18 de Agosto, os "Bons Sons" da música portuguesa provaram que estão para ficar, na aldeia de Cem Soldos, Tomar, com o Zêzere em pano de fundo.
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Aqui não há pó por todo o lado. Nem filas intermináveis para comer uma bifana. Na sua 5.ª edição, de 14 a 18 de Agosto, os “Bons Sons” da música portuguesa provaram que estão para ficar, na aldeia de Cem Soldos, Tomar, com o rio Zêzere em pano de fundo. 

por Patrícia Maia
 

Ruas estreitas com lojinhas, largos, uma praça e uma igreja. Gente local que se mistura com os ‘forasteiros’ do festival com um sorriso. E ainda, preços acessíveis aos bolsos mais económicos: 1.50 euros a cerveja e 75 cêntimos o copo de vinho. Não é o cenário típico de um festival mas é assim que o Festival Bons Sons acontece, de dois em dois anos, na aldeia de Cem Soldos.

Este ano, o programa contou com cerca de 80 concertos e outras atividades, como projeção de curtas metragens. A festa arrancou dia 14 com JP Simões como cabeça de cartaz, embora já na véspera, quarta-feira, em jeito de aquecimento, se tenha celebrado a “Receção do campista” com um concerto de Holy Nothing e um DJ set de Bons Rapazes.
 
Image and video hosting by TinyPicSexta-feira, os fãs de Long Way to Alaska perderam o concerto da banda que cancelou a presença por motivos de saúde. Mas assim, Gisela João teve direito a mudar para o Palco Eira, maior e mais potente do que o palco Giacometti, onde estava previsto atuar. Com a sua voz rouca e o sorriso (sempre) irreverente, a fadista de trajes moderno agarrou a audiência e pôs todos, os mais novos e os mais velhos, a dançar ao som de fados e viras, culminando da sua versão da “Mariquinhas” com letra da rapper Capicua – que estaria no mesmo palco algumas horas depois.

No sábado, os Guta Naki chegaram ao Bons Sons anunciando que este seria o seu último concerto. Juntos há sete anos, e com dois álbuns na bagagem, a banda despediu-se em grande: a sensualidade de Cátia a fundir-se com a (des)armonia da guitarra de Nuno e do baixo de Dinis.
 
Outro destaque deste dia vai para o rock irreverente dos Osso Vaidoso. Formada por Alexandre Soares e pela vocalista Ana Deus (ambos antigos elementos dos Três Tristes Tigres), a banda vai buscar, para as suas letras, textos de autores portugueses como Cesariny ou Luís Pacheco, imprimindo uma irreverência que, aliada ao talento dos elementos da banda, nos faz querer mais.

Sons certeiros em palcos trocados?

Sábado foi também um dia de ‘palcos trocados’. Ao músico Noiserv calhou o palco Giacometti que não chegou para as centenas (ou milhares) de pessoas que o queriam ouvir pelo que muitos dos fãs acabaram por ver o concerto através do écran projetado em frente ao posto de informação. 
 

Já Ricardo Ribeiro, o fadista, tomou conta do palco principal. Apesar do talento incontestável do ‘príncipe’ da cancão que já é património imaterial da humanidade, este fado encaixaria, talvez, melhor noutra hora e num palco mais pequeno. Mesmo assim, a voz poderosa de Ricardo encheu o espaço e as imitações finais com que o fadista brindou a audiência – de Carlos do Carmo, António Zambujo ou Maria da Fé – deram uma nota de humor e surpresa ao concerto. 


Também o espetáculo dos Aduf, projeto de José Salgueiro e José Peixoto, calhou na hora e no palco errado. Era demasiado tarde para um concerto conceptual como este. As atenções dispersam-se, àquela hora, perante este valioso projeto que confere (literalmente) uma nova dimensão aos tradicionais adufes (pandeiro quadrangular que os Aduf ampliaram em proporções gigantes). 
 
A ‘ressurreição’ de Sérgio Godinho

Nos concertos da tarde de domingo, destaque pra o virtuosismo do guitarrista António Chaínho acompanhado pelos seus músicos. No mesmo palco, Amélia Muge interpretou temas basilares da sua carreira como “Taco-a-taco” e terminou com umas convidadas muito especiais: as Sopa de Pedra, um jovem grupo vocal feminino que fez coro com a cantora.


Um dos pontos mais altos do último dia terá sido o concerto dos We Trust marcado pelo carisma contagiante do vocalista André Tentúgal. A acompanhar a banda esteve a orquestra filarmónica Guadilm Pais, garantindo um lado sinfónico que encaixou na perfeição no rock dos We Trust, sendo que Noiserv também subiu ao palco com a sua caixa de sons. No final, Tentúgal fez o ‘encore’ que se esperava, desta vez com o single “We are the ones” em versão acústica com o público a cantar a letra em uníssono. 

Sérgio Godinho não “soube a pouco” porque deu um concerto de hora e meia onde provou que a sua carreira não tem prazo de validade, acompanhado pelos seus músicos virtuosos num trabalho de equipa que não passa despercebido em palco. 
 

A meio do concerto deu-se o incidente já amplamente noticiado nos meios de comunicação: Sérgio Godinho caiu do palco, num acidente aparatoso, quando cantava o clássico “Com um brilhozinho nos olhos”. Silêncio, luzes apagadas, caras de preocupação.

Mas pouco depois o músico regressa e prossegue com quase uma hora de concerto, terminando com o seu hino à “Liberdade” cuja letra garante: “Só há liberdade a sério quando houver liberdade de mudar e decidir”.

Apesar do susto, sem querer, Sérgio encarnou uma metáfora que se aplica na perfeição à música (e à sociedade) portuguesa: pode cair, pode magoar-se, mas volta a levantar-se e segue em frente. Sobretudo com a ajuda de festivais como este!

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