Em poucas palavras, o 360S é uma das grandes inovações desportivas que o Benfica tem ao dispor dos seus atletas e treinadores para os ajudar a maximizar o seu treino e, consequentemente, melhorar a performance individual e coletiva do clube.
Como parte integrante do Benfica Lab – infraestrutura que procura, de forma ativa, potenciar, auxiliar e melhorar o rendimento dos jogadores – o 360S é composto por uma sala com cerca de 40 m², quatro paredes revestidas a rede LED, um relvado sintético e quatro lançadores de bola.
Enquanto vai controlando remotamente os próximos exercícios, Nuno Maurício, coordenador do equipamento, explica-nos mais exaustivamente em que consiste o 360S. “É uma máquina de treino virtual na qual procuramos replicar no contexto digital situações de jogo e de treino de forma a potenciar o desenvolvimento das capacidades técnicas, físicas e psicológicas dos jogadores”.
Destaca que a grande vantagem deste equipamento, exclusivo do Benfica, foi ter resultado de uma parceria estratégica. O clube e o Benfica Lab associaram-se a uma empresa de tecnologia portuguesa – a 360S. Esta sinergia beneficiou do know-how científico e desportivo do Benfica; e o Benfica Lab beneficiou do conhecimento tecnológico da empresa. Juntos criaram um produto próprio, muito acima do Estado da Arte, uma vez que até à data da sua implementação, 2014, apenas a equipa de futebol Borussia Dortmund possuía um sistema semelhante – o Footbonaut – mas mais limitado em certos aspetos.
O potencial deste aparelho é extraordinário porque ele permite elaborar um número infindável de exercícios. Para Nuno Maurício, a “imaginação é o nosso limite e, neste momento, posso confidenciar que temos 150 exercícios inseridos na nossa base de dados”.
Cada um destes exercícios é preparado “para diversas posições, para diversos jogadores”, de tal forma que também há exercícios genéricos e lúdicos, importantes para os jogadores de escalões mais baixos.
O também responsável pelo departamento de vídeo análise, hesita em responder quais os exercícios que aqui são testados de forma recorrente. Mas avança que os de caráter genérico, que servem de aquecimento, são importantes para “adaptar o atleta à máquina”, até porque “ainda que sendo o mesmo exercício, ele vai variando de escalão para escalão e de jogador para jogador”.
A necessidade de um jogador treinar nesta caixa é sempre definida com base na parceria existente entre as três áreas que fazem parte do Benfica Lab – observação e análise, fisiologia e nutrição – e as equipas técnicas. Nuno explica que a partir daí “procuramos adaptar as funcionalidades da máquina e dos exercícios à
s necessidades específicas de cada jogador ou do treinador para uma determinada posição. Se o treinador quer trabalhar jogadores numa determinada posição para um determinado estímulo, nós podemos fazer esse tipo de exercícios”.
A caixa 360S foi adaptada à realidade do clube e o seu desenvolvimento teve como objetivo “tornar a máquina mais próxima do jogo e daquilo que os jogadores e treinadores procuram e precisam”. Em termos técnicos e operacionais, “para além dos exercícios com animações de figuras humanas,
também podemos por objetos, figuras geométricas, idealizar os movimentos que quisermos nas paredes. Podemos fazer com que as bolas saiam dos canhões com velocidade de 20 a 120 km/h – o que é importante para o trabalho dos guarda-redes, por exemplo, com diferentes ângulos de saída de bola – parar a bola no peito, na coxa, ou mais alto ainda para os guarda-redes. Com efeitos na bola – para a esquerda ou para a direita – para dificultar a receção”.
Tendo à sua disposição um equipamento desta natureza, os próprios jogadores sentem-se motivados porque acabam por treinar as suas habilidades profissionais de forma lúdica e divertida.
É esta capacidade criativa e mutante do equipamento que acaba por influenciar a própria modalidade futebolística, uma vez que “não queremos um treino fechado porque depois vamos ter um jogo fechado e pouco aberto a mudanças”.
Numa desmonstração do potencial da caixa 360S, Pedro Rodrigues, jogador da equipa B do Benfica, executou alguns passes inicialmente programados por Nuno Maurício. Para o atleta, os treinos neste equipamento têm grandes benefícios, como “capacidade de passe, de reação, de remate e de receção”. Além disso, referiu que “queremos sempre evoluir para bater os resultados que temos (…). Isto é como um jogo e gostamos de desafiar-nos no dia-a-dia”.
Uma vez realizado o treino, o responsável da caixa indica que os dados surgem de duas maneiras. “Uma de visualização fácil e rápida para o jogador, treinador e analista, que aparece refletida numa das paredes mal termina o exercício. Neste caso surgem três métricas muito fáceis para o atleta perceber – pontuação, precisão e tempo de reação e execução do exercício”. Não obstante, há inúmeras outras métricas que são compiladas e que são enviadas para o servidor central, ligado à base de dados interna do Benfica Lab. Com cerca e dez anos, esta base cruza as informações de cada uma das áreas do Lab e depois emite relatórios “que podem ser genéricos, individualizados e também adaptados às necessidades específicas, seja do atleta, seja do treinador”. Posteriormente, torna-se possível estabelecer métricas e percentagens de melhoria do desempenho. De forma indireta, a partir dos reports emitidos, contudo Nuno esclarece que “só no final de um meso ciclo ou de uma época é que conseguimos aferir de forma coerente e correta se houve evolução ou não”. Ou de forma imediata, “através da observação dos treinos que são filmados”, já que a caixa tem duas câmaras, uma em cada canhão.
O responsável da “caixa mágica” do Benfica supõe que, na atualidade, o 360S é único na Europa, sendo para o clube uma “mais-valia porque permite juntar a tecnologia e a inovação tecnológica ao serviço de uma atividade humana que é o desporto, que é no fundo o nosso foco principal”.
Nuno Maurício não sabe dizer ao certo o número de jogadores que já treinaram na caixa 360S, contudo ao apontar para as marcas do relvado, vemos que a máquina já foi usada muitas vezes! E, embora esteja particularmente voltado para o treino futebolístico, Nuno não tem dúvidas quanto à possibilidade de usar o 360S fora do âmbito e da modalidade futebol. “Porque não para parques temáticos, escolas, outro tipo de desportos? Há aqui potenc
ial para ser explorado, sem dúvida”.
Na verdade, no 360S constata-se que é possível gamificar a prática profissional desportiva. Além disso, percebe-se como um clube deve e pode apostar na inovação e na tecnologia para desenvolver a performance dos seus jogadores, uma vez que a tecnologia “permite-nos fazer isso, não só de uma forma mais rápida, mais fácil, mas também mais correta que vai mesmo ao pormenor – o tal 0,0001% que nos permite chegar à vitória e ao sucesso”, sublinha Nuno Maurício.
Este equipamento prova que o investimento de um clube em inovação é importante para alcançar resultados melhores e mais consistentes porque, apesar de ainda estar numa fase de franco desenvolvimento e evolução, em dois anos de funcionamento “já estamos a ter resultados e estamos a perspetivar como vão ser os resultados da corrente época desportiva”, acrescenta o responsável.
Sem precisar os valores investidos no 360S, o seu coordenador admite que esta aposta do Sport Lisboa e Benfica deixa toda a equipa do Benfica Lab satisfeita, mas também os desafia a procurar ainda mais inovações, mais possibilidades no mercado ou a criarem internamente esse tipo de soluções.
A partir do momento que a inovação faz parte dos valores internos do Benfica Lab, este centro desenvolve outras práticas inovadoras, assim como utiliza outros equipamentos e estudos igualmente modernos para otimizar o rendimento do seu jogador e, coletivamente, da equipa. Todavia, por uma questão de política interna, tais procedimentos são confidenciais, não só por uma questão estratégica, mas também porque o Benfica Lab procura “fazer as coisas bem-feitas e apresentar resultados consolidados”, afirma Nuno Maurício.
De assinalar que, apesar de o Benfica Lab estar focado no futebol profissional e no de formação, a sua equipa, de 20 a 30 profissionais, também intervém nas modalidades de pavilhão, nomeadamente basquetebol, andebol, voleibol, futsal e hóquei em patins.
Como nota final, esclarecemos que ao procurar realizar um trabalho jornalístico exaustivo sobre as estratégias inovadoras que os grandes clubes desportivos têm vindo a adotar, a i9 magazine entrou em contacto com os três maiores clubes nacionais. Porém, nem o Sporting Clube de Portugal, nem o Futebol Clube do Porto responderam em tempo útil ao nosso pedido, daí que não tenham sido integrados nesta reportagem.
O conteúdo Benfica Lab – Como um clube desportivo pode (e deve) inovar aparece primeiro em i9 magazine.