Um estudo realizado por uma equipa de investigadores do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS), da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), revela que as crianças do sexo masculino com maus hábitos de sono apresentam risco muito elevado de obesidade.
Com base nas recomendações da Academia Americana de Pediatria (2016), que estabelece a duração adequada de sono entre as 9 e 12 horas por noite para as crianças dos 6 aos 12 anos, o estudo, desenvolvido nos últimos seis anos, teve como objetivo analisar a relação entre os hábitos de sono irregulares (ou seja, menor ou maior que a duração recomendada do sono) e o risco de excesso de peso e obesidade na população pediátrica portuguesa.
Os investigadores estudaram os hábitos de sono de 8.273 crianças (4.183 do sexo feminino) com idades entre 6 e 9 anos, bem como a atividade física e os comportamentos sedentários (por exemplo, o tempo passado a ver televisão ou a jogar no computador), através de questionários preenchidos pelos pais. Foram também avaliadas algumas variáveis antropométricas, como a estatura e o peso das crianças e calculado o seu índice de massa corporal (IMC).
As associações entre os hábitos de sono e o risco de excesso de peso e obesidade para meninos e meninas foram realizadas separadamente. Os resultados, publicados no American Journal of Human Biology, evidenciam que «os rapazes que apresentavam hábitos de sono irregulares para a sua idade, isto é, quer abaixo das 9 horas/noite quer acima das 12 horas/noite, durante a semana, têm 128% maior probabilidade de serem classificados como crianças com excesso de peso comparativamente com aqueles que dormiam as horas recomendadas», afirma o investigador Aristides Machado-Rodrigues.
Curiosamente, mas tal como em alguns estudos anteriores, entre as raparigas, «não houve associações significativas entre a duração do sono e o risco de obesidade, nem nos dias da semana nem durante o fim de semana», declara o investigador do CIAS, realçando, no entanto, que «o cumprimento dos hábitos de sono recomendados na infância, no nosso ponto de vista, é um aspeto crucial da saúde cognitiva e do desenvolvimento harmonioso das crianças.»
A obesidade é considerada uma das epidemias do século XXI pelo facto de estar associada a inúmeras cormobilidades, especialmente de natureza metabólica e cardiovascular. Aristides Machado-Rodrigues salienta «a sua etiologia multifatorial», referindo «a existência um conjunto alargado de variáveis, de natureza biológica, genética, social e comportamental, que concorrem decisivamente para o facto de um indivíduo poder padecer de adiposidade aumentada, para além do padrão normal.»
As conclusões deste estudo, que está inserido numa investigação mais ampla sobre Prevalência da Obesidade na Infância em Portugal coordenada por Cristina Padez, e financiada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), chamam a atenção para a necessidade de esforços adicionais para controlar os hábitos de sono durante a semana, especialmente entre os rapazes portugueses.
Aristides Machado-Rodrigues enfatiza que «os pais devem reforçar as regras familiares da “hora de deitar” das crianças para que estas possam ter o tempo de sono diário recomendado para a saúde. A literatura sustenta, de forma inequívoca, que a privação do sono, especialmente em idades pediátricas, está associada a problemas de saúde aumentados, não só de índole cognitivo mas especialmente relacionados com a diminuição da tolerância à glicose, o qual é um fator de risco para a obesidade».
«Na atualidade, e de forma muito pragmática, não podemos deixar de manifestar a nossa preocupação para os comportamentos sedentários de ecrã, vulgo tablets, telemóveis e computadores, que as crianças e jovens perpetuam pela “noite dentro”, comprometendo as horas de sono recomendadas, muitas vezes fechados no quarto e sem conhecimento dos pais», realça o investigador.
Nos últimos anos, estudos epidemiológicos relataram que a duração irregular do sono pode ser um fator de risco adicional para excesso de peso entre as crianças. No entanto, os hábitos de sono são os que têm merecido menor atenção comparativamente a outros comportamentos do nosso quotidiano, como a atividade física, os hábitos nutricionais, ou ainda o sedentarismo.
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