Ciência

Portugueses desvendam enigma ligado à infertilidade

Há quase um século que os cientistas tentavam perceber a importância dos centríolos na formação do embrião. O mistério foi agora desvendado por uma equipa portuguesa e traz nova luz sobre uma das causas da infertilidade feminina.
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Há quase um século que os cientistas tentavam perceber a importância dos centríolos na formação do embrião. O mistério foi agora desvendado por uma equipa portuguesa e traz nova luz sobre uma das causas da infertilidade feminina.
 
Na fertilização, o embrião herda informação genética e estruturas celulares essenciais da mãe e do pai. No entanto, o embrião só herda os centríolos – estruturas responsáveis pela divisão celular – oriundos do espermatozoide, ou seja, do pai. Numa gravidez 'normal', os centríolos da mãe são eliminados quando se forma o óvulo. Esta ocorrência era conhecida desde o início do século passado, mas a sua importância para a fertilidade permaneceu um enigma até agora. 
 
Uma equipa liderada por Mónica Bettencourt-Dias (na foto) no Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) resolveu este mistério, lançando luz sobre um mecanismo cuja falha resulta em infertilidade e que pode ter implicações mais vastas no funcionamento de muitos outros tipos de células.
 
Os resultados deste estudo, agora publicado na prestigiada revista científica Science, mostram que os centríolos têm normalmente um revestimento que os protege e este revestimento é perdido no interior do ovócito, a célula precursora do óvulo, levando à eliminação dos centríolos. As mulheres que não processam a eliminação dos centríolos femininos são inférteis.
 
"O mecanismo pelo qual os centríolos [maternos] desaparecem nos ovócitos de todos os animais era uma incógnita e ao mesmo tempo um paradoxo, uma vez que se pensava que estas estruturas eram excecionalmente estáveis" diz Mónica Bettencourt-Dias. 
Utilizando a mosca da fruta (Drosophila melanogaster), como uma ferramenta experimental para estudar este processo, Ana Marques e Inês Bento, investigadoras da equipa, perceberam que os centríolos são eliminados em etapas. Em primeiro lugar, perdem o seu revestimento e só depois desaparecem.
 
Perceberam também que a perda do revestimento do centríolo é desencadeada pela perda de um regulador importante destas estruturas, uma proteína de nome polo. "Surpreendentemente, foi suficiente manter a polo para manter o revestimento dos centríolos e evitar a sua eliminação no ovócito. Algo que ninguém tinha sido capaz de fazer antes", diz Ana Marques.
 
A relevância para a reprodução sexual da perda dos centríolos no ovócito também não era conhecida. "Quando artificialmente mantivemos os centríolos da mãe, o embrião resultante tinha centríolos em número excessivo (maternos e paternos), resultando em divisões celulares anormais e desenvolvimento abortado, demonstrando assim que a eliminação dos centríolos é essencial para a reprodução sexual", diz Inês Bento.
 
Este estudo tem implicações mais vastas. "É provável que este mecanismo de ligar/desligar os centríolos possa afetar muitas das funções destas estruturas incluindo a formação e regeneração de vários tecidos, e que possa estar alterado em doenças como o cancro", acrescenta Mónica Bettencourt-Dias. 
 
Este estudo foi realizado no Instituto Gulbenkian de Ciência e financiado pela Organização Europeia de Biologia Molecular (EMBO), Conselho Europeu de Investigação (ERC) e Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT; Portugal).
 

Sugerida por António Resende

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