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Maria Manuel Leitão Marques

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1-Que balanço faz do Simplex+ 2016? Que medidas destaca e quais os erros encontrados?

Eu faço um balanço positivo e o primeiro fator que gostava de sublinhar, ainda antes de falar em números, é de o programa se ter reinstalado na Administração Pública, de termos medidas de todas as áreas do Governo, de termos medidas de colaboração com os Governos locais e isto para mim é em si mesmo um fator positivo, diria mesmo, até um pouco estranhamente, fosse qual fosse o resultado. Quer dizer, obviamente se tivéssemos zero por cento de medidas concluídas não seria bom, mas qualquer percentagem significativa seria para mim uma percentagem positiva, tendo em conta que estivemos quatro anos sem Simplex, que a Administração Pública não tem propriamente incentivos para ser inovadora em termos financeiros, de as organizações e os funcionários terem da sua parte esta disponibilidade para sugerir novas medidas e se comprometerem com elas em datas relativamente exigentes, foi por si mesmo um aspeto positivo. Estamos a falar de inovação e o mais importante da marca Simplex é instalar dentro da Administração Pública uma cultura permanente de inovação, simplificação, uma cultura não avessa ao risco nem à mudança e infelizmente essas culturas não se instalam por decreto, que se publicasse em Diário da Republica e a partir desse momento tudo fosse diferente. São mudanças que se vão fazendo, com pequenos ou grandes passos, que se vão acumulando nos diferentes serviços, uns mais ousados do que outros e o Simplex é isso mesmo, tem medidas mais ousadas e outras mais simples de executar. No final do ano tivemos um bom resultado, não 100%, que é sempre aquele que gostaríamos de ter, mas de mais de 80% quase 90% relativamente às medidas cujo prazo de termos já foi concluído e temos também bons resultados quando avaliamos essas medidas, dizendo que as empresas pouparam dinheiro e a Administração Pública também se tornou mais eficiente. Há medidas que são importantes e que já deveriam existir há mais tempo, por exemplo falamos do Registo Criminal, já que muitos profissionais têm de fazer prova da sua ficha criminal e agora está disponível. É sem dúvida uma medida muito simbólica porque abrange muita gente. Mas há também outras medidas que eu gostava de destacar pelo seu caráter inovador e por estarem alinhadas com tendências para o futuro dos serviços públicos, e vou destacar duas. Uma é o IRS Automático, não abrange todas as pessoas, mas para aquelas que abrangeu foi muito mais cómodo e inclusivamente vantajoso do ponto de vista financeiro, visto que a devolução foi muito mais rápida. Para além disso o que a medida tem de inovador é o Estado substituir-se ao cidadão no cumprimento das suas obrigações quando já dispõe da informação necessária para o poder fazer. Esta é uma tendência da Administração, não pedir duas vezes a informação e usar a tecnologia para poder reutilizar dados que já estão disponíveis em qualquer registo com autorização do cidadão de forma transparente para o substituir. A outra medida com esta tendência mais futurista que o Simplex introduziu foi avisar as pessoas que o seu cartão do cidadão vai perder a sua validade, permitindo-lhes marcar a sua renovação evitando aquilo que assistimos neste verão, em que as pessoas foram para uma fila de espera perder o seu tempo de férias ou de trabalho. Cada vez é mais importante incentivar as pessoas a programarem a renovação dos seus documentos, até porque renovar um documento não é um serviço urgente excepto quando o mesmo já caducou.

2-Quais as principais barreiras e desafios para mudar uma cultura que ainda não tem uma mentalidade tão digital como se esperava?

Acho que há barreiras, por exemplo, quando os serviços online estão mal feitos, quando são pouco usáveis. Há barreiras mesmo para os infoincluídos quando os serviços não obedecem a critérios de boa usabilidade. Estamos a investir muito, a rever novos serviços online para ver se as coisas são rápidas, simples de usar, se existem obstáculos na sua utilização. Para ter uma ideia, a Chave Móvel Digital, que é um serviço ótimo que me permite não usar o meu Cartão do Cidadão e poder-me identificar com segurança, tem uma barreira à entrada no sistema. Estamos agora a melhorar esse sistema. Outro ponto são as pessoas que não sabem ou não podem, ou não usam os serviços online. Temos de estar atentos a montante da inclusão dessas pessoas. Criámos um programa que se chama INCode que tem vários eixos. O primeiro é o da inclusão, porque todas as pessoas são susceptíveis de ser incluídas, não digo como programadores mas como utilizadores do Skype, ou do Whatsapp, de poder falar com os seus familiares mais distantes, poder ter a sua página do Facebook e entrar num mundo de relações sociais, quem diz Facebook diz outras redes sociais, portanto, serem utilizadores de coisas simples mas que hoje são muito inclusivas, não apenas para usarem os serviços públicos mas é óptimo que os usem. Temos igualmente de trabalhar para ter mais zonas com wifi, trabalhar com as autarquias para que as pessoas que não têm acesso poderem ter. O Estado tem de fazer a sua parte, trabalhar com organizações da natureza social e também com o poder local para podermos disponibilizar a infra-estrutura, mas não basta! Para além da infraestrutura temos de ensinar as pessoas a usar as tecnologias. O programa tem também outras vertentes como qualificar os funcionários públicos na área tecnológica, desenvolver mais investigação para não ficarmos atrás nas tecnologias de ponta.

3-Tem resultados sobre a implementação das medidas do ano passado? Taxa de execução?

Nós fizemos um estudo com a Universidade Nova de Lisboa e gostamos sempre de quantificar. Não basta quantificar, é preciso saber se as pessoas estão a usar e se gostam de usar, mas sim, quantificámos quanto é que as empresas poupavam com 11 medidas e as empresas abrangidas por estas medidas poupam cerca de 568 milhões de euros por ano.

 

4-Para explicar aos nossos leitores: o que é o Simplex Jam?

É preciso dizer que que o Simplex é um programa construído em co-criação com cidadãos que nos sugerem as medidas e também muito com os nossos funcionários. Não é um programa que o Governo imponha as medidas, embora que também as sugira, mas a grande maioria das medidas do Simplex sempre foram feitas com a colaboração dos funcionários. É muito importante em diversos momentos, primeiro na seleção das prioridades, os funcionários, muitos deles identificam os problemas que têm no seu dia a dia e no caso do Simplex Jam foram feitas reuniões em todo o país e nessas mesmas reuniões estavam colaboradores dos diferentes serviços desconcentrados do Estado na mesma sala, portanto, estavam os funcionários das Finanças, da Agricultura, da Segurança Social e em conjunto foram sugerindo medidas e algumas das quais integraram o Simplex. Esta é a primeira fase de participação dos funcionários, depois na fase de implementação do desenvolvimento de execução das medidas inscritas no programa, nós também chamamos os funcionários desde o início, para participarem, para darem as suas opiniões, para integrarem o grupo de trabalho. Quando digo funcionários, não falo apenas dos dirigentes dos serviços, falo de todos os funcionários que trabalham com os serviços, e que nos vão dizendo quais os problemas, o que é difícil de fazer, etc. Este envolvimento da Administração que é feito por pessoas é muito importante não apenas para estimular uma cultura de simplificação, uma cultura de inovação e para que as medidas sejam cumpridas.

5-Para o Simplex+ 2017 que medidas é que destaca?

Em 2016 tivemos 255 medidas que ainda não prestámos contas sobre todas porque são medidas que se prolongam por mais de que um ano. Eu gostaria de destacar neste Simplex uma nova categoria que foi criada para melhorar o atendimento nos serviços públicos. O atendimento é o interface com o cidadão. Eu costumo dizer que não há nenhuma boa medida Simplex que resista a um mau atendimento. O Cartão do Cidadão é uma medida fantástica, tanto pelo impacto que teve dentro da Administração Pública como é bom para o cidadão, mas se o atendimento for mau fica tudo estragado. Neste Simplex criámos um conjunto de medidas para melhorar o atendimento nos sítios mais críticos, sobretudo na Segurança Social, já que é uma área com muito atendimento presencial, porque as pessoas não querem ou não sabem fazer de outra maneira. O atendimento não é só criar serviços online, ou linhas telefónicas, ou apps, é também uma questão de linguagem. Nós fizemos agora, dentro de um projeto que é muito importante do ponto de vista da inovação, o LabX, um espaço de experimentação, e prototipámos, um novo serviço que é um ponto único de atendimento quando perdemos um familiar e temos de tratar da burocracia relacionada com o óbito. Na experiência do protótipo que fizemos verificámos que algumas vezes a resposta que o funcionário dá à pergunta que o cidadão lhe faz, é tecnicamente correta mas quando este sai e interrogado sobre o que lhe foi dito, não entendeu. É culpa do funcionário? Não, ele deu a resposta tecnicamente correta, mas o trabalho a desenvolver é traduzir a linguagem técnica numa linguagem acessível às pessoas que procuram o serviço. A conclusão que tirámos desta experiência foi que é preciso falar numa linguagem comum a todos os cidadãos. Aqui não é uma questão de tecnologia mas sim de fazer com que a mensagem seja bem transmitida.

6-Quais as áreas de governação que exigem um maior desbloqueio de burocracias?

No fundo são todas, umas com maior impacto no cidadão, que se relacionam com maior proximidade do cidadão, mas para que isto corra bem há tudo o que não se vê, o chamado backoffice, portanto é muito importante que melhoremos a eficiência da Administração, porque perderemos muito menos tempo com as tarefas inúteis.

 

7-Quais os principais aspectos críticos relativos ao eGovernment nos municípios portugueses?

Há autarquias fantásticas, que são muito pró-ativas, muito inovadoras e existem outras que estão mais atrás. Nem todas têm os mesmos recursos para se poder modernizar, mas sabemos que umas são mais pró-ativas do que outras. A primeira questão importante é estimular a colaboração entre autarquias, para que umas possam “contaminar” as outras, no bom sentido. Temos de perder aquele preconceito de que as autarquias é que são o inferno e que as autarquias ainda não se modernizaram. Há autarquias que não e outras que sim! Mas em geral, há da parte das autarquias boa vontade, até porque isto hoje rende, como se costuma dizer. Hoje ser um bom autarca não é apenas fazer boas estradas ou pintar a cidade, a parte virtual, os Orçamentos Participativos, a forma como comunica, como disponibiliza a informação também já é importante, e há autarquias a fazer apps das suas festas, das suas feiras, dos seus percursos turísticos, etc. É fundamental este esforço por duas razões, em primeiro lugar, porque hoje e cada vez mais no futuro as autarquias são um poder de proximidade, no fundo se a autarquia não é inovadora, a imagem que os cidadão têm é que o estado não é inovador, porque a autarquia é quem eles vêem na sua rua, quem recolhe o seu lixo, quem lhes dá informação e no fundo é lá que nós vivemos e se está tudo mal nós reclamamos não apenas do autarca mas do Estado em geral. O segundo motivo, e que para mim também é muito importante, é que o Simplex em algumas áreas só chega às pessoas se trabalharmos em conjunto com as autarquias. Se quer abrir uma empresa em Mação ou em Proença-a-Nova, por exemplo, dependendo do setor, pode depender apenas de licenças que são atribuídas pela autarquia ou depende da autarquia e da Administração Central em simultâneo. Do ponto de vista do empresário o que ele pretende é tratar de tudo num só balcão, quer começar a trabalhar e para ele o processo de licenciamento é apenas um, seja qual forem as entidades que se tem de relacionar, sejam elas quais forem, por isso, para nós oferecermos ao empresário o que ele está à espera, temos de trabalhar em conjunto com a autarquia. Temos este ano uma experiência que iremos fazer de trabalho com as autarquias que é a harmonização da regulamentação.

8-Portugal foi pioneiro em algumas áreas de eGovernment, a nível europeu. Como se posiciona, hoje, o país, quando comparado com o resto da UE?

Hoje há muitos mais países a serem inovadores, dado o último relatório que a OCDE publicou, há exemplos do México, da Colômbia, Indonésia, etc. O número de países que para quem a inovação no setor público se tornou, ou a título experimental ou com projetos já bem-sucedidos com resultados já obtidos, é maior, o que mostra que a inovação no setor público se tornou um desafio progressivamente expandido por diferentes países, o que é bom porque vamos aprendendo uns com os outros. Temos o exemplo do Orçamento Participativo Portugal, que os outros países querem ver como irá funcionar em Portugal. O nosso país continua a ter iniciativas em áreas importantes, e os outros países olham para nós como nós olhamos para eles. Mas neste momento não olho para nenhum país como exemplo, procuro nos diversos países as iniciativas em que nos podemos inspirar.

9-Quer a população, quer as empresas portuguesas, estão a acompanhar o ritmo da modernização em termos de eGovernment?

Sim, a inovação é desde sempre importante para as empresas. As empresas portuguesas também têm esse desafio muito grande, porque Portugal se não for um país inovador, se não tiver, tanto no setor público como no privado, ou no social, de encontrar novas respostas, dificilmente correspondem às expectativas dos seus clientes de forma a manter a confiança.

 

10-Em que se baseia o projeto de Inovação Social?

O projeto de Inovação Social baseia-se em encontrar novas respostas mais viradas para a medição dos resultados e não apenas para o subsídio das organizações sociais. Por exemplo, eu posso ter uma boa ideia mas preciso de um empurrão para tornar a ideia mais conhecida, ou para me organizar financeiramente, para informatizar a minha empresa, para projetos de capacitação, ou projetos como foi a Academia de Código em Lisboa em que o investidor é remunerado de acordo com os resultados que pretende obter que são avaliados de forma independente, ou projetos de parcerias em que há investimento de uma Fundação e do Estado para uma iniciativa social, no fundo para estimular um setor que pense um bocadinho na transparência na relação entre o Estado e as organizações sociais.

 

10-Falando do Orçamento Participativo Portugal, qual o balanço até à data?

Para já é um balanço positivo. Esta é uma primeira experiência, com um valor até relativamente reduzido, mas quem experimenta não pode arriscar muito, porque estamos a trabalhar com dinheiro de impostos das pessoas. Foi, no fundo, para criar cultura para um Orçamento Participativo Nacional que não é propriamente um Orçamento Participativo da Freguesia. Fazer propostas para o país inteiro ou para a região é muito mais difícil, portanto nós não tínhamos a certeza que resultasse, mas tivemos cerca de 600 propostas validadas, exequíveis e que cabem no orçamento. Aliás, esta é uma parte muito importante, fazer propostas para um determinado orçamento já que é muito fácil dizer que se fosse Ministro fazia este e aquele projecto mas as pessoas, muitas das vezes não sabem quanto custam esses mesmos projetos. A ideia de saber quanto custa e de envolver o cidadão é muito importante, é muito pedagógico do ponto de vista de mudar o modo como governamos. Esta é a grande força dos projetos do Orçamento Participativo. No final faremos uma avaliação geral para se alterar algo que achemos que deva ser alterado. Mas neste momento sabemos que a iniciativa teve impacto, que as pessoas conseguiram fazer propostas a nível regional e nacional e por isso, tudo isto nos leva a repetir a iniciativa no próximo ano e até alargar a mais áreas.

 

11-Que impacto está a ter (e terá), para Portugal, a  implementação das últimas diretivas  europeias sobre Contratação Pública Eletrónica?

Eu espero que algumas das medidas de simplificação facilitem a contratação, houve medidas para estimular a concorrência e o acesso das pequenas e médias empresas à contratação pública, como seja poder fazer a contratação por notas, poder diminuir os limiares do ajuste direto, ou seja, ser mais difícil fazer ajustes diretos favorecendo a participação das pequenas e médias empresas nos contratos públicos.

 

Inovar é…
Arriscar. Nem toda a inovação é bem-sucedida, quem inova muito não acerta sempre. Tem que se controlar o risco e criar um espaço de experimentação, onde se estuda, corrige ou abandona, caso a experiência não tenha tido sucesso. É não ter medo de falhar melhorando a qualidade dos serviços internamente ou externamente

Virtudes de uma Ministra…
Não ter medo e gostar do que faz. Tudo isto dá muito trabalho e muita exposição pública e quando falhamos sabemos que somos muito castigados e portanto temos sempre que tirar partido da oportunidade que nos dão de poder melhorar a vida das pessoas, das empresas e do país. Essa é grande fonte de energia.

Lema de Vida….
Eu gosto demasiado da vida para ter um lema. Eu sou um espírito muito positivo e tento não quebrar com as dificuldades.

App Favorita
Várias. Vou dar uma oportunidade a uma app difícil que está a fazer um caminho complicado que é a My SNS. Não está perfeita mas merece que seja adotada e melhorada pelos cidadãos porque a um hospital todos deveremos ir um dia e por isso destaco o trabalho feito até à data. Gostava de referir outra que é o Mapa do Cidadão. É uma app nossa que me permite tirar a minha senha antes de sair de casa, saber quanto tempo falta para ser atendido poupando assim o tempo que poderia estar na fila de espera. São duas apps da Administração Pública que sinalizam duas áreas transversais.

Hobbies…
Tenho muitos. Montanha, ir á praia, ler livros de viagens e de viajantes.

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